De Alconchel, conta-se uma lenda Templária que o mundo apagou da memória mas que os Cavaleiros do Templo Português guardaram carinhosamente. A história é-nos contada num velho pergaminho escrito por um ermitão coevo dos acontecimentos:
" Havia tempo que o castelo de Alcoucel fora tomado aos muçulmanos pelos Templários, tornando-se o seu Castelo de Ferro, num enclave permanentemente em guerra. A Ordem do Templo tinha tomado sob sua protecção a população moçárabe mesmo sabendo que entre ela havia os que espiavam e conspiravam contra a presença cristã. Entre os conspiradores havia um jovem moçárabe por quem uma bela moura se havia apaixonado.
Este mantinha o seu amor por ela em segredo para não a comprometer se algo corresse mal e fosse apanhado. Sem o saber, há algum tempo que o jovem era alvo da atenção de um Cavaleiro Templário que sabia do seu amor pela linda moura e que estava também ele, por ela secretamente apaixonado.
Ao Cavaleiro restava-lhe calar fundo a dor daquele amor impossível, pois era-lhe vedado pela Regra exteriorizar a sua paixão.
Todos os dias o jovem ia trabalhar às escondidas, na minagem de uma das muralhas do castelo, sabendo que se preparava um ataque muçulmano para breve. Nas vésperas desse ataque caiu uma tempestade medonha e o jovem conspirador empenhou-se afincadamente na sua missão de sabotagem ao coberto dos enormes aguaceiros que naquela noite se abatiam sobre a região.
Dentro da mina, o destino tecia o drama que se iria desenrolar.
Vindo, não se sabe de onde, uma torrente de lama acumulava-se por detrás do tabique que protegia o trabalho do jovem. Este ao aperceber-se do perigo jogou as costas de encontro às tábuas para tentar conter a barreira que começava a ceder. Devia ter fugido e não o fez. Depressa entendeu que aquele acto irrefletido o levara a uma armadilha mortal. Se tentasse agora fugir seria apanhado pelo desmoronamento imediato. Se ficasse, aguentaria até mais não poder, mas acabaria por morrer subterrado.
Em pânico, começou a gritar por ajuda. Já sem forças, despedindo-se da vida num adeus desesperado, gritou o nome da bela moura.
Por entre a lama que lhe toldava a vista, descortinou a figura altiva do guerreiro Templário. - Ajuda-me, por favor...
Sentindo ao seu lado a força das robustas costas do Cavaleiro abrandar a pressão da barreira, o jovem gritou aliviado: - Juntos vamos conseguir!
Mas o Templário sabia que não havia saída daquela armadilha para os dois e gritou para o jovem: Vai-te sem demora! Salva-te!
O jovem moçárabe tentando retribuir algum altruísmo, ainda contestou a decisão do Cavaleiro: - Então morreremos aqui os dois! Não te abandono! A culpa disto é minha, não é justo que te sacrifiques por um sabotador!
Com dureza na voz e um gelo intenso no olhar, o Templário encarou o jovem e ordenou-lhe: - Vai! Um grande amor espera-te lá fora! Volta para a tua moura! Depois, murmurando baixinho, acrescentou. - Não suportaria vê-la infeliz por ti...
Na manhã do dia seguinte, enquanto os sinos de alarme batiam a rebate perante a eminência do ataque e a população se refugiava no castelo, eu um velho ermitão que ali também procurava protecção encontrei o jovem que escavava desesperadamente com as mãos um monte de lama e destroços que tinham deslizado monte abaixo naquela noite. - O que fazes, jovem louco? Isso é hora de escavar na lama? Vamos ser atacados! Mas o jovem parecia não o ouvir e só dizia: - Tenho de lhe dar digna sepultura! Tenho de lhe dar digna...
Durante o ataque, os muçulmanos passaram pelo jovem moçárabe que, ignorando-os, continuou, com as mãos já ensanguentadas, a escavar no local como um louco. E, tomado por louco, também foi ignorado pelas tropas árabes.
O corpo do Templário foi encontrado muitas horas depois e resgatado pelos Irmãos da Ordem.
Comovido por este acto de amor e abnegação, contei mais tarde neste pergaminho a história do que aconteceu."
O Cavaleiro Templário de Alconchel foi sepultado com toda a dignidade no seu Castelo de Ferro enquanto que a Lenda da sua coragem ficou viva para sempre na memória do Templo.
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